O rastro de serpentes peçonhentas ao redor do planeta deve sofrer alterações drásticas até o ano de 2070, por causa da perda do habitat natural de espécies diante das mudanças climáticas. É o que alerta um estudo publicado por pesquisadores de quatro países, na última terça-feira, 5, na revista The Lancet Planet Health, uma das mais prestigiadas do mundo científico.
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O professor do Departamento de Biologia e coordenador do Laboratório de Pesquisas Integrativas em Biodiversidade da Universidade Federal de Sergipe, Pablo Ariel Martinez, liderou a pesquisa internacional com cinco estudantes de graduação e pós-graduação da UFS, em parceria com pesquisadores da Espanha, Alemanha e Costa Rica.
O levantamento, a partir de bancos de dados com informações sobre 209 espécies venenosas no mundo, indica que as alterações na condição do clima vão afetar a distribuição geográfica das serpentes nas próximas quatro décadas. Os danos dessas mudanças no habitat natural dos animais peçonhentos, segundo Martinez, estão relacionados à biodiversidade e à saúde pública.
"Prevê-se que as alterações climáticas tenham efeitos profundos ao longo dos anos. Estamos falando de consequências como a perda da biodiversidade e alterações nos padrões de envenenamento de seres humanos e animais domésticos," pondera o pesquisador.
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Desequilíbrio ecológico
No ecossistema, as cobras atuam para o equilíbrio da cadeia alimentar ao se alimentarem de roedores, sapos e lagartos. Em contrapartida, é alimento para o gavião e o gambá. Por isso, a ameaça de extinção por causa de alterações climática no planeta afeta a biodiversidade.
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O estudo projeta a perda de até 70% de áreas consideradas potenciais para a sobrevivência de espécies, como Viperinae, víbora endêmica na Europa, Ásia e África; Crotalinae; a exemplo da jararaca vermelha encontrada do Brasil; e Hydrophiina, que são serpentes marinhas.
Por outro lado, a pesquisa prevê que a expansão de áreas climaticamente adequadas deve afetar cerca de 50% das espécies Viperinae. Os maiores aumentos de áreas habitáveis são previstos para a Bitis rhinoceros, conhecida como víbora do gabão (251%); Vipera aspis, chamada de víbora-áspide (136%); e Vipera ammodytes, ou popularmente víbora de chifres (118%).
"Projetamos que a maioria das espécies se perderá na região da Amazônia na América do Sul e no sul de África. Em contrapartida, as regiões do leste dos EUA, norte da Europa e sudeste da Ásia ganharão um número substancial de novas espécies de serpentes," afirma Martinez.
Risco à saúde pública
O acidente ofídico, como é denominado envenenamento por picada de cobra, provocou a morte de 94 pessoas, em 2022, no Brasil, de acordo com dados do Ministério da Saúde. As regiões Norte e Nordeste do país concentraram mais da metade dos óbitos no período analisado.
Como a maioria dos soros antiofídicos para tratar a intoxicação são fabricados a partir do veneno da própria serpente, o desaparecimento ou a introdução de novas espécies em uma determinada região também representa um risco à saúde pública médica e veterinária.
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"Se as espécies deixam seu habitat natural e migram para novas áreas, isso pode dificultar a identificação dos animais peçonhentos para a obtenção do material genético para a produção de antídotos," ressalta a mestra em Ecologia e Conservação da UFS, Irene Teixeira.
Ao combinar as mudanças climáticas a fatores socioeconômicos, como populações rurais e de baixa renda, a pesquisa aponta que os continentes africano e asiático vão estar mais vulneráveis ao ofidismo. Uganda, Quénia, Bangladesh, Índia e Tailândia são os países com os maiores riscos.
"Os nossos resultados sinalizam que são necessários mais estudos regionais e globais para entender o contexto científico e as políticas de conservação, particularmente nos países suscetíveis as maiores perdas de espécies de serpentes," acrescenta Pablo Ariel Martinez.
Josafá Neto
comunica@academico.ufs.br