Mesmo após a sanção da Lei de Resíduos Sólidos (12.305) em 2010, o descarte de pneus usados ainda é um campo pouco explorado em Aracaju. Pensando nisso, a pesquisadora Danielle Thaís Barros de Souza Leite propôs uma investigação sobre as consequências desse descarte e um melhor aprofundamento sobre a logística reversa em seu Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente, sob a orientação do professor Adauto de Souza Ribeiro, do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
A lei determina que é responsabilidade dos fabricantes dos produtos o seu destino pós-consumo, cabendo incentivo por parte do governo para que o descarte seja consciente e econômico para ambos os lados e para o bem estar social.
Durante o ano de 2016, a pesquisadora coletou dados sobre os descartes feitos apenas na capital de Sergipe e os relacionou com três dimensões dos indicadores de sustentabilidade: econômica/financeira, ecológica/ambiental e social.
De acordo com o orientador, Adauto Ribeiro, é essencial tratar o descarte de pneus para além da questão da saúde. É preciso também pensar de forma social e econômica a própria aplicação da logística reversa nesse caso. “Porque todas as logísticas reversas acabam tendo um foco mais econômico e é preciso reavaliar a logística porque do jeito que está só um lado leva vantagem”, salienta o professor.
Segundo a pesquisadora, estudar a questão baseada na lei e aplicando o conceito de logística reversa é um caminho pouco percorrido pelos estudiosos. “Em Aracaju, especificamente, não havia nenhum estudo voltado a logística reversa de pós-consumo de pneus inservíveis quando iniciei a pesquisa”, aponta. “Temos uma realidade que não atende ao que a lei exige em relação aos pneus inservíveis. Lembro que estudei pneus inservíveis e que esta denominação ainda não é muito conhecida mesmo no meio acadêmico”, completa.
Indicadores de Sustentabilidade
A pesquisa constatou que pouco se evoluiu no estado em relação ao descarte. O recolhimento de pneus inservíveis, em Aracaju, é feito pela Secretaria Municipal de Saúde, que também promove campanhas de descarte consciente visando à prevenção da proliferação do habitat de mosquitos transmissores de doenças. O reaproveitamento dos pneus recolhidos é feito em Feira de Santana (BA), o que demanda custos adicionais de transporte. Na capital há apenas um ponto de recolhimento, no bairro Santa Maria. O local tem a capacidade de abrigar até 20.000 pneus.
Pensando também na dimensão ambiental, a pesquisadora aponta que “O município deveria promover campanhas ou projetos para que as empresas realizassem a destinação correta, com propostas de criação de empresas de reciclagem na região”. sugere, tendo em vista que uma das deficiências enfrentadas é a falta de tecnologias capazes de dar outra finalidade aos pneumáticos.
“Também ficou claro que as boas práticas de gestão dos resíduos derivados de pneus podem ser otimizadas”, relata Danielle. “Outro fator interessante são os empregos diretos e indiretos que podem ser gerados pela coleta, armazenagem e transporte dos pneus, sendo assunto sugerido para futuras pesquisas e mensuração”, propõe, como forma paliativa de atender a dimensões sociais.
Danielle compreende que a logística reversa importa ainda mais ao setor econômico, destacando que o retorno do material para as fábricas e distribuidoras garantiria uma economia considerável. “Poderia ser estabelecido pelo Poder Público o incentivo econômico para as empresas que utilizarem compostos de resíduos dos pneus como matéria-prima de seus produtos. Essa determinação faria com que essas empresas buscassem o desenvolvimento de pesquisas e tecnologias para o melhor aproveitamento desses resíduos de forma a torná-los indispensáveis na cadeia produtiva”, completa.
Responsabilidade de todos
As análises apresentadas na pesquisas deixaram evidente a falta de compromisso da capital sergipana em ressignificar os pneumáticos. Mesmo ciente de que o seu descarte inadequado não atingiria apenas a saúde de toda a população, como o meio ambiente em geral. É importante lembrar que as formas mais comuns de uso pós-consumo são o descarte a céu aberto, tornando o pneu um criadouro de mosquitos, e a sua incineração, provocando uma fumaça tóxica, a qual não se sabe ainda o quão prejudicial pode ser ao ser humano, além de uma possível contaminação dos lençóis freáticos com os restos dessa queima.
A necessidade de se atender à Lei 12.305/10 é urgente e Danielle usa de seu estudo para apontar algumas medidas imediatas a serem tomadas para a diminuição dos impactos na sociedade. E destaca também que se a logística reversa fosse realmente atendida em Aracaju, os benefícios seriam ainda mais relevantes, visto que cerca de 65% de novos pneus no país são fruto da iniciativa, segundo dados de 2016, da Reciclanip (Associação que representa os fabricantes de pneus no Brasil e braço sustentável da ANIP).
Mas a pesquisadora acredita na eficiência dessas determinações, caso mais setores se envolvam na discussão do descarte indevido e do destino pós-consumo, sendo que somos todos atingidos. “A responsabilidade sobre os resíduos se torna compartilhada por cidadãos, empresas, prefeituras e os governos estadual e federal”, conclui.
Para saber mais
A tese utilizada nesta matéria pode ser acessada, na íntegra, no Respositório Institucional da UFS, clicando aqui.
Outra pesquisa divulgada em matéria do UFS Ciência aborda a logística reversa de resíduos sólidos em Aracaju, no caso, sobre o descarte de produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
Marília Souza (bolsista)
Marcilio Costa
comunica@ufs.br