As fissuras labiopalatinas podem afetar o processo de alimentação, a fala e causar distúrbios respiratórios, mas há outro fator importante que tem preocupado os profissionais e pesquisadores da área: a falta de informação e de orientações adequadas. Essa lacuna é observada de maneira mais intensa nos bebês com fissura, especialmente durante as fases de aleitamento e de introdução alimentar.
Esse tema é abordado nos trabalhos “Métodos de Introdução Alimentar na Pupulação com Fissuras Labiopalatinas: Revisão Integrativa da Literatura” e “Métodos de Alimentação de Recém-Nascidos e Lactentes com Fissuras Labiopalatinas: Revisão Integrativa da Literatura”, publicados pela professora Natália Leite do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS) no XXIX Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia e no XI Congresso Internacional de Fonoaudiologia.
O principal alerta que a pesquisadora faz é que, ao contrário do que muitos imaginam, a literatura e a prática clínica indicam que não há necessidade de utensílios especiais para o aleitamento, nem de restringir, limitar ou modificar o preparo dos alimentos que serão oferecidos às crianças com fissuras. Ao iniciar a introdução alimentar, é desejável, inclusive, que o bebê com fissura faça a refeição de forma integrada à família, sem separações.
“O período da introdução alimentar é muito importante para o desenvolvimento das habilidades orais e sensoriais e para o aprendizado alimentar. O que acontece é que muitos pais e cuidadores, por medo de engasgos ou escape de alimento pelo nariz, limitam as experiências alimentares destas crianças, quando o único cuidado especial necessário nesta fase é atentar para a postura do bebê”, pontua.
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“O atraso ou uma introdução alimentar feita de forma pouco adequada, quando somada a outros fatores, como experiência negativas relacionadas à constante manipulação oral (cirurgias, intubações, internações) pode levar a dificuldades alimentares que podem acompanhar o paciente na infância ou, até mesmo, durante toda a vida”, adiciona.
Essa falta de informação, contudo, não está limitada aos pais e cuidadores. Segundo a professora, muitos profissionais de saúde ainda realizam orientações defasadas e, mesmo nas maternidades, muitas vezes os bebês são alimentados por sonda sem, de fato, necessitarem desta via alternativa de alimentação. Geralmente o uso de sonda é indicado para bebês que, além da fissura, apresentam uma síndrome associada ou outra condição de saúde.
"O aleitamento é viabilizado por meio da utilização de utensílios simples, como mamadeiras tradicionais de bico de látex ou silicone macio, por meio de copo ou mamadeira dosadora (a escolha do utensílio será feita com base na melhor adaptação do bebê e segurança da mãe) e, da mesma forma que ocorre no período de introdução alimentar (a partir dos 6 meses de vida), são necessários cuidados voltados à postura da criança – que deve ser mais elevada", pontua.
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“O Brasil dispõe de cerca de 30 serviços especializados. Além de não ser um número suficiente, poucas são as equipes localizadas no Nordeste, dificultando o acesso ao atendimento, especialmente para quem mora no interior. Porém, existem profissionais como fonoaudiólogos, médicos e cirurgiões-dentistas que, mesmo não fazendo parte da equipe de um serviço especializado, estão atualizados e capacitados para o atendimento deste público, ainda que de maneira segmentada”, acrescenta.
Para suprir esta demanda, Natália coordena duas ações de extensão para capacitar estudantes do curso de graduação em Fonoaudiologia do campus de Lagarto para avaliação, diagnóstico e intervenção clínica junto aos pacientes com fissuras labiopalatinas e também levar informações básicas a pais e cuidadores sobre o processo de reabilitação, por meio das mídias digitais.
Estudante de Fonoaudiologia da UFS, Raquel Stephanie participa das ações de extensão e pretende aprofundar a pesquisa sobre o tema no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). "É um assunto de extrema importância na formação profissional e, por isso, pretendo a partir de agora desenvolver um e-book com orientações sobre terapia de fala de fissurados."
A professora também coordena um projeto de iniciação científica que busca identificar o conhecimento que fonoaudiólogos, médicos e cirurgiões-dentistas atuantes no interior de Sergipe têm sobre os protocolos de reabilitação das fissuras labiopalatinas. Depois dos resultados, serão oferecidos cursos de atualização e capacitação sobre a temática, promovendo o atendimento adequado à população que convive com as fissuras laboopalatinas.
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O interesse da pesquisadora pela temática surgiu durante as atividades práticas do curso de especialização em Motricidade Orofacial que realizou em um hospital do Recife/PE. Na ocasião, ela realizou atendimentos a crianças, adolescentes e adultos atendidos no serviço especializado em reabilitação de pacientes com fissuras labiopalatinas.
“Eu comecei a me interessar mais e pesquisar sobre o tema porque não estava satisfeita com os meus resultados e com o que estava oferecendo aos meus pacientes”, explica. A partir disso, a docente cursou a Residência, o mestrado e o doutorado relacionados à área de motricidade orofacial na Universidade de São Paulo (USP).
Ana Laura Farias
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