Ter, 31 de março de 2020, 10:53

Biocarvão feito do bagaço da laranja pode ser usado para tratamento de água
Produto permitiria reuso da água da irrigação na própria lavoura e também para tratamento de águas domésticas

O Brasil é o maior produtor de laranja do mundo, sendo que Sergipe é um dos líderes no plantio do fruto - apesar da crise no setor que já dura alguns anos. O país é também o maior exportador do suco, principal alvo da produção, e que gera uma grande quantidade de resíduo, o bagaço da laranja.

A citricultura exige o consumo de uma grande quantidade de água por meio da irrigação. Em meio a crises de escassez de água, conseguir utilizá-la na agricultura - na qual a maior quantidade de água potável é gasta - é uma medida econômica e ambientalmente sustentável. Para isso, no entanto, é necessário que a água seja tratada, já que ela carrega substâncias químicas oriundas de agrotóxicos usados na lavoura.

Uma pesquisa de doutorado desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (Prodema) da Universidade Federal de Sergipe combinou os dois desafios da citricultura, propondo o uso do bagaço da laranja na produção de biocarvão para o tratamento de água residuária. A ideia da autora, Roseanne dos Santos Carvalho, é o aproveitamento da água tratada no próprio plantio do fruto. Serviria também para tratamento de águas residuárias domésticas para uso humano.

Produção do biocarvão

O tratamento consiste na produção de um biocarvão a partir do bagaço de laranja, para um tratamento que retenha o micropoluente tetraciclina, mas que mantenha os nutrientes comuns a esse tipo de efluente, substituindo o adubo químico.


Roseanne dos Santos Carvalho é autora da pesquisa. (Fotos: Adilson Andrade - Ascom/UFS)
Roseanne dos Santos Carvalho é autora da pesquisa. (Fotos: Adilson Andrade - Ascom/UFS)

A tetraciclina é utilizada na lavoura no controle de fungos e bactérias, e pode ser também encontrada em águas residuárias domésticas, pois se trata de uma família de antibióticos largamente utilizados no controle de doenças.

A primeira tentativa de produção do biocarvão do bagaço de laranja teve a proposta de ser fabricada em forno artesanal, mas segundo Gregório Guirado Faccioli, orientador da pesquisa, os resultados não foram os esperados. “Especificamente para esse estudo, o bagaço da laranja precisava estar completamente carbonizado e o forno artesanal não conseguiu fazer isso”.

Roseanne explicou que “o plano B foi produzir o biocarvão em ‘mufla’”, uma estufa para altas temperaturas usada em laboratórios, e que, ao final, foi fabricado cerca de 1kg do produto. Após isso, foi feita uma análise de microscopia eletrônica no biocarvão para caracterizá-lo em aspectos como porosidade e indicar para qual uso poderia ser destinado.

Segundo Gregório, a pesquisa é inédita, pois geralmente os tratamentos de água têm como objetivo eliminar bactérias e não fármacos, pois é um processo muito caro. De acordo com os resultados, portanto, é possível realizar essa filtragem utilizando o biocarvão do bagaço de laranja, que seria um processo relativamente econômico.


Segundo o orientador Gregório Guirado Faccioli, a pesquisa é inédita ao apresentar uma proposta para eliminação de fármacos nesse tipo de água residual.
Segundo o orientador Gregório Guirado Faccioli, a pesquisa é inédita ao apresentar uma proposta para eliminação de fármacos nesse tipo de água residual.

Testes

Para avaliar a eficácia no pós-tratamento da água residuária, foram feitos testes utilizando-a na irrigação de rabanetes. O biocarvão de bagaço de laranja conseguiu adsorver 100% da tetraciclina do efluente doméstico e sua eficiência de filtragem foi 25% maior que a do carvão ativado comercial.

Ainda segundo Gregório, atualmente a legislação é impeditiva quanto ao uso de efluentes domésticos na irrigação de agricultura, mas, afirma o professor, “os resultados da pesquisa mostraram que os rabanetes não foram contaminados”.

Para saber mais

A tese pode ser acessada na íntegra no Repositório Institucional da UFS, clicando aqui.

Brunna Martins (bolsista)
Marcilio Costa
comunica@ufs.br


Atualizado em: Ter, 31 de março de 2020, 10:59
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