Fazer com que os resultados cheguem ao maior número de pessoas possível. Esse é um dos objetivos do projeto “Ecophysica – Abordando propriedades fundamentais da biodiversidade global”, liderado pelo professor do Departamento de Ecologia da UFS (Deco) Sidney Feitosa Gouveia. A iniciativa é mais uma das ações da comunidade científica no sentido de democratizar o conhecimento produzido laboratórios afora.
“Nós estamos pensando em um projeto que possa ser feito da maneira mais aberta e inclusiva possível, que é um aspecto que raramente é olhado nos projetos de pesquisa. As instituições que financiam estão sempre interessadas nos resultados, nas publicações, nos artigos e congressos, mas agora tivemos a oportunidade de financiamento por um instituto que é preocupado com essa democratização do conhecimento”, diz o professor.
O instituto é o Serrapilheira e o assunto do projeto é cheio de nuances que tratam de macroecologia partindo de princípios básicos da ciência da vida. O projeto, que tem a coordenação de Sidney, é o resultado da colaboração de pesquisadores de várias universidades do Brasil, como da Federal de Goiás (UFG), da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e de uma universidade espanhola, a Universidad Rey Juan Carlos. O projeto foi um dos 65 escolhidos em um universo de quase 2.000 propostas enviadas ao instituto.
A proposta
A proposta principal, segundo o professor, é partir de princípios básicos que afetam o que chama de matéria comum e entender os processos ecológicos em escala maior. “Princípios da termodinâmica e da hidrodinâmica são coisas que afetam os organismos e prova disso é que quando vamos para lugares mais quentes, suamos mais. Isso é reflexo de uma propriedade física básica: se aumenta a temperatura aumenta-se também a evaporação da água e todos os organismos passam por isso”.
Mesmo parecendo uma constatação bastante óbvia, os pesquisadores querem entender como esses processos afetam e podem ser ligados a padrões ecológicos que estão em macroescala. “Tentamos entender como essas reações fisiológicas afetam a espécie numa escala ampla. Onde, por exemplo, essa espécie está distribuída e quais podem estar ocupando determinada região. A contribuição conceitual do projeto é fazer essa ponte entre a escala microfisiológica e a escala macroecológica”.
Através dessa ponte eles almejam alcançar respostas para os impactos que mudanças climáticas podem provocar nas espécies, além de atestar de que maneira os reflexos de alteração de clima afetam o ambiente e as condições das espécies – e supor se elas irão persistir ou não diante dessas mudanças.
Experiências
O projeto foi desenhado, primordialmente, para animais terrestres, mas a ideia geral se aplica a qualquer organismo, como diz Sidney. “A lógica pode ser estendida para qualquer grupo, só estamos trabalhando com animais terrestres porque precisávamos de um modelo mais específico e também porque na água há algumas pequenas mudanças”.
Dentro dessa especificação, as primeiras experiências estão sendo feitas com modelos de anfíbios, como sapos e rãs, animais que são muito sensíveis à variação ambiental. “Eles funcionam praticamente como uma superfície de água, ou seja, eles perdem água muito fácil, desidratam muito fácil, aquecem muito fácil. Então eles são bons modelos para isso e começamos por aí”, afirma.
O interesse dos pesquisadores é entender duas características fundamentais na relação desses seres com o ambiente: o tamanho do corpo e a resistência da pele. Entender, sobretudo, como essas características mudam ao longo do tempo e do espaço geográfico em função das pressões ambientais – quando o ambiente fica mais seco e eles precisam armazenar água.
“Uma consequência disso é que eles conseguem/tendem a ficar maiores, porque quando são maiores conseguem armazenar mais água por uma propriedade geométrica básica. Essa propriedade geométrica favorece que eles conservem mais água, mas, além disso, faz com que possam se adaptar de outras maneiras, por exemplo, aumentando a resistência da pele à perda de água”, conta Sidney.
Modelo matemático
Para chegar a resultados mais específicos os pesquisadores estão trabalhando com um modelo matemático que prevê qual combinação de características desses organismos devem ser selecionadas para aumentar o tamanho e a resistência da pele. Esse modelo, segundo o professor, é o aspecto mais inovador de toda a pesquisa.
“Esse modelo nos permite saber as implicações importantes de como esses organismos vão responder às mudanças ambientais onde eles estão distribuídos. Esse é um primeiro passo, o primeiro modelinho do resultado que a gente já tem, e funciona muito bem” diz.
Há também um modelo mais complexo, em que os pesquisadores expandiram o grupo focal e incluiu também os répteis, cujas características são diferentes. “O problema dos répteis é a temperatura, aquecimento e resfriamento. A partir de funções parecidas, de troca de água e calor com o ambiente, a gente conseguiu prever/projetar um modelo espacial de como devem ser as distribuições, o tamanho desses bichos em macroescala”.
A ideia agora é seguir com o trabalho e mostrar os resultados finais até o início de 2019, que é quando o edital irá afunilar o apoio para cerca de 12 pesquisas.
Instituto Serrapilheira
O Serrapilheira é uma instituição privada sem fins lucrativos, criada com o intuito de valorizar a ciência e aumentar sua visibilidade e impacto no Brasil. O instituto apoia projetos de pesquisa e divulgação científica nas áreas da Ciência da Computação, Ciências da Terra, Ciências da Vida, Engenharias, Física, Matemática e Química.
Segundo o site do instituto, que começou a funcionar em 2018, eles operam com recursos oriundos de um fundo patrimonial constituído por uma doação de R$ 350 milhões.
Ronaldo Gomes (bolsista)
Luiz Amaro
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