Qua, 06 de maio de 2020, 09:16

Professor usa ‘fanfics’ para estimular leitura e produção textual
Pesquisa em mestrado profissional permitiu uma análise do desempenho dos alunos ao usarem o recurso

Lidar com os gêneros textuais tradicionais da língua portuguesa pode ser uma tarefa difícil e entediante, sobretudo para uma geração que cresce lidando com tecnologias estimulantes e atraentes. Nas últimas duas décadas, as escolas começaram a usar as novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) para tentar atrair a atenção dos estudantes para o conteúdo das aulas. Com isso, os alunos têm acesso a diferentes formas de leitura e escrita, que estimulam ainda mais a criatividade e produção.

Boa parte dos jovens já estão familiarizados com o ambiente virtual, o que facilita a inserção de narrativas digitais no ambiente escolar. Com isso em mente, Wlademyr de Menezes, ao desenvolver sua dissertação de mestrado no Programa de Pós-Graduação Profissional em Letras da UFS, decidiu usar as “fanfics” como ferramenta pedagógica e, consequentemente, objeto de estudo.

Fanfic vem do inglês fanfiction, que em português significa “ficção de fã”, ou seja, uma narrativa fictícia criada por admiradores de um produto cultural (como filmes e séries), usando como base personagens e cenários do conteúdo original.

O trabalho, que consistiu em realizar oficinas que visam à leitura, à compreensão crítica e à elaboração de fanfictions, foi desenvolvido com alunos do 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede estadual em Aracaju, onde Wlademyr leciona Português e Inglês.

“Um dos maiores desafios na escola era fazer com que os alunos produzissem textos, algo muito difícil para todos os professores. Então veio a ideia de usar um gênero como o qual eles fossem familiarizados, para criar um estímulo. Após muitas pesquisas, chegamos às fanfics, e eu os outro professores ficamos surpreendidos, pois não sabíamos que escreviam tanto esse tipo de texto. Mas só escrever não bastava, era preciso que eles lessem também. Pedimos para que fizessem todo trabalho de leitura, e só depois partissem para a produção dos textos”, conta o pesquisador.

Processo de produção

As narrações construídas foram baseadas em histórias originais - chamadas de cânones no universo fanfiction - das quais os alunos eram fãs, tendo liberdade para explorar as características de linguagem verbal e não verbal. Após escritas, por duplas ou trios, as fanfics passaram pelo processo de correção e reescrita de forma coletiva.


Wlademyr de Menezes: "O trabalho final ficou incrível, eles conseguiram trabalhar os temas de uma maneira bem leve". (Foto: Waldênnia Soares - Ascom/UFS)
Wlademyr de Menezes: "O trabalho final ficou incrível, eles conseguiram trabalhar os temas de uma maneira bem leve". (Foto: Waldênnia Soares - Ascom/UFS)

“Como a escola não tinha um laboratório de informática, eles usaram seus celulares para produzir e publicar as fanfics em grupos de discussão. Após publicadas, conseguimos ter uma noção da receptividade dos seguidores. E isso é muito interessante, pois mostra ao aluno que a produção textual tem um porquê. Vai ter uma pessoa do outro lado da rede que vai ler e opinar, permitindo que ele consiga melhorar a história”, explica o pesquisador.

Na opinião de Beto Vianna, orientador do trabalho, o gênero é de uso dinâmico e tem uma boa aceitação dos alunos. “As fanfics são, se a escola quiser, se a escola permitir, um instrumento político. Nesse caso, é possível dizer que tanto as tecnologias digitais e virtuais, quanto as fanfics, contribuem para a aprendizagem, pois o que está em questão aqui não é adquirir habilidades ou competências, mesmo que no meio do caminho elas sejam adquiridas, mas ampliar e melhorar o espaço relacional das pessoas, o aprender politicamente”, disserta.

Para Wlademyr, proporcionar a leitura, a interpretação e a produção de narrativas ficcionais, através de um gênero digital, foi muito satisfatório. Os alunos tiveram a oportunidade de expor sua visão sobre histórias como as quais já eram familiarizados, oriundas de produtos midiáticos, como filmes, livros e quadrinhos. “O trabalho final ficou incrível, eles conseguiram trabalhar os temas de uma maneira bem leve. O meu único trabalho com eles foi seguir a linha do professor de português, como olhar a parte de ortografia e concordância”, narra.

Beto enfatiza que, além de fanfics, é preciso de escolas, gestores públicos e educadores mais libertários. “Tenho impressão que os alunos, em geral, tendem a ser mais colaborativos quando a atitude da escola e dos professores é mais acolhedora. Se as fanfics ajudarem no processo, e acho que ajudam, tanto melhor”, arremata.

Para saber mais

A dissertação está disponível na íntegra no Repositório Institucional da UFS, clicando aqui

Fernanda Roza (bolsista)

Marcilio Costa

comunica@ufs.br


Atualizado em: Qui, 07 de maio de 2020, 14:29
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