Ter, 20 de agosto de 2019, 16:17

Gibis ajudam a popularizar a ciência da computação entre os jovens
Projeto ‘Almanaque da Popularização da Ciência da Computação’ já produziu mais de 70 gibis em quase 10 anos

A linguagem e as novas tecnologias da informação (TI), inteligência artificial, algoritmos, computação afetiva e até a propriedade intelectual são algumas das áreas da Ciência da Computação (também abrange Sistema da Informação e Engenharia da Computação) que mais podem ser visualizadas e comentadas nos dias atuais. São pautas que frequentemente podem ser vistas no noticiário, em programas de variedades, nas redes sociais, em filmes e até na música. Porém, é um desafio e tanto explicar os conceitos e suas aplicações no nosso cotidiano para o público mais jovem, a fim de popularizar o conhecimento de TI, gerando interesse na área.

Mesmo sendo uma esfera promissora, o campo da tecnologia sofre com a carência de profissionais formados no País. Segundo o relatório The Network Skills in Latin America”, divulgado pela IDC, o Brasil possui a maior falta de profissionais no campo entre os países da América Latina. Em 2018, o setor teve um déficit de 195 mil profissionais qualificados. Em meio a esse cenário, surgiu o projeto “Popularização da Ciência da Computação”, na Universidade Federal de Sergipe (UFS), que tem como principal objetivo despertar nos jovens, futuros universitários e empreendedores o interesse na área da computação através do uso das Histórias em Quadrinhos (HQs).

A história do Almanaque

Financiado via bolsa de Produtividade CNPq e UFS (PIBIX/PIBITI/PIBIC), o projeto Almanaque para Popularização de Ciência da Computação utiliza como base os gibis criando enredos para se comunicar com os jovens sobre o conhecimento computacional de forma didática, simples, objetiva e visual. O projeto é coordenado pela professora adjunta do Departamento de Computação (DCOMP) e membro do Programa de Pós-graduação em Ciência da Computação (PROCC) da UFS, Maria Augusta Silveira Netto Nunes.


Chancelado pela Sociedade Brasileira de Computação, o Almanaque está na série 12, com 70 gibis produzidos em quatro anos. (Foto: Adilson Andrade – Ascom/UFS)
Chancelado pela Sociedade Brasileira de Computação, o Almanaque está na série 12, com 70 gibis produzidos em quatro anos. (Foto: Adilson Andrade – Ascom/UFS)

A professora conta como o projeto, que já tem quase 10 anos, começou. “Ele começou mais ou menos em 2011, era um projeto grande onde a gente construía softwares para auxiliar no tratamento do AVC. Depois a gente viu que era bastante interessante (uso dos gibis) como forma de popularizar conceitos. E aí, a gente criou esse projeto do Almanaque para a popularização da Ciência da Computação e começamos a fazê-los nessa época”, afirma a coordenadora.

Antes de 2014 existiram experiências isoladas do uso das histórias em quadrinhos (HQs) para a disseminação do conteúdo computacional, mas foi somente a partir de 2014 que se intensificaram as produções e que houve um fomento no projeto.

“Hoje, em 2019, a gente já está na série 12. Então, nós desenvolvemos bastante, com bolsas de iniciação científica, tecnológica e de extensão na UFS. Quando tinha mais fomento, eu tinha 6, 7 alunos bolsistas. Hoje a gente quase não tem porque não tem bolsa”, enfatiza Maria Augusta.

As bolsas seriam destinadas para alunos de design e do próprio Dcomp (Departamento de Computação) para funções de roteirizador e ilustrador. “A gente tem muito gibi ainda roteirizado, mas sem ilustrador. Se eu parasse hoje de fazer gibi e só produzisse esses eu teria para mais de um ano, se eu conseguisse o ilustrador. Hoje tá muito difícil pegar o ilustrador sem bolsa, então não tenho conseguido pegar ninguém do design”, confessa a coordenadora.

A escolha do gênero História em Quadrinho se deu justamente por ser um tipo de conteúdo amplamente consumido entre o público jovem no Brasil, o que iria estimular e popularizar a leitura sobre ciência da computação nessa faixa etária. “Como a gente perde muito aluno e às vezes nem perde, eles nem entram porque já têm medo, então, resolvemos fazer os gibis para popularizar. Mostrar para eles, de uma forma mais leve, a ciência da computação, para quando entrarem não verem como tão ‘demoníaco’”, ressalta a professora.

Até 2019, foram produzidos 70 gibis do projeto, porém, em decorrência da falta de recursos, a grande maioria deles não é impressa. A professora Maria Augusta conta que havia o planejamento de se fazer uma biblioteca itinerante, onde os jovens poderiam pegar as cartilhas ler e devolver, porém novamente, o empecilho foi a falta de dinheiro para imprimir. A ideia acabou sendo descartada.

Chancelado pela SBC (Sociedade Brasileira de Computação), o Almanaque para popularização da Ciência da Computação aborda os mais diversos conceitos da área em meio a histórias que envolvem o cotidiano sergipano e personagens com características brasileiras, o que torna tudo de fácil assimilação. Inteligência artificial, propriedade intelectual, computação afetiva, banco de dados são algumas das áreas que têm os enredos ilustrados nas HQs.


A professora Maria Augusta Silveira Netto Nunes coordena o projeto Almanaque e lamenta a escassez de bolsas para recrutar mais estudantes para a tarefa. (Foto: Mariane Góis – Bolsista Posgrap/Copes)
A professora Maria Augusta Silveira Netto Nunes coordena o projeto Almanaque e lamenta a escassez de bolsas para recrutar mais estudantes para a tarefa. (Foto: Mariane Góis – Bolsista Posgrap/Copes)

Mais recentemente, foi produzido um “guia pedagógico do professor”, para auxiliar o docente a aplicar as histórias em quadrinhos em sala de aula. Por exemplo, saber em quais disciplinas deve usar tal gibi e como fazer a sua avaliação. A partir desse guia se desenvolve o pensamento computacional, que é transversal e interdisciplinar.

Como o processo da idealização do gibi - produção (roteirizar, ilustrar) e a finalização - é longo, o trabalho em equipe é vital, como ressalta Maria Augusta. “A gente tá na série 12, e em 4 anos produzimos 70 gibis. É um trabalho que não é mérito meu e sim da equipe toda, das pessoas que ajudaram a levar adiante, dos mestrandos que estão fazendo isso virar aplicável na educação”, conclui a coordenadora.

Aprendizado e evolução

Ícaro Dantas Silva, 27 anos, Mestrando de Ciência da Computação na UFS, assume o papel de roteirizador no projeto. Ele estuda o conteúdo que vai ser abordado no gibi e dali cria personagens, cenários, enredo, diálogos.

“Tive conhecimento do projeto nos primeiros semestres do curso de graduação. Quando cursava Ciência da Computação na UFS, sempre tive o desejo de fazer pesquisa, então fui atrás de projetos de PIBIC para começar a minha jornada na área acadêmica. Conversei com professores e perguntei sobre seus projetos, dos projetos disponíveis. O que mais me interessou foi o do Almanaque para popularização de Ciência da Computação através dos gibis. Sempre gostei de histórias em quadrinhos e isso contribuiu muito pelo meu interesse na pesquisa”, diz o mestrando.

Fazer parte de um projeto como esse possibilita evolução e aprendizado no campo pessoal, no acadêmico e até no profissional, é o que ressalta Ícaro. “Me ajudou pessoalmente e academicamente. Foi como bolsista que conheci sobre aplicações e áreas da computação, que vão além do que a própria graduação, aulas e avaliações, possa fornecer. Os gibis já foram trabalhos em sala de aula por um aluno de mestrado, e serão aplicados em salas de aula através de outras teses também de mestrado, como a minha. Roterizei cerca de 20 gibis até o momento, os quais já foram apresentados no Campus Party do Rio Grande do Norte. Eu e Maria Augusta já fomos premiados com o terceiro melhor projeto PIBIC de 2018 do CCET”, destaca.

Já Albert Barbosa, 25 anos, formado em Design Gráfico na UFS e ilustrador do projeto, também acentua os pontos positivos de ter participado do projeto do Almanaque. “No início, foi uma contribuição do projeto para mim. Uma evolução pessoal e profissional também. A partir dessas ilustrações e dessas cartilhas eu consegui desenvolver minha técnica e a aperfeiçoei. Hoje eu consigo um resultado melhor e com menos tempo em relação à primeira cartilha que foi feita. Então eu só ganhei com esse projeto. Inclusive fui bolsista duas vezes”, salienta.


O projeto Almanaque recebeu menção honrosa na área de Ciências Exatas e da Terra, no 28º Encontro de Iniciação Científica (EIC) da UFS, em 2018. (Foto: Adilson Andrade – Ascom/UFS)
O projeto Almanaque recebeu menção honrosa na área de Ciências Exatas e da Terra, no 28º Encontro de Iniciação Científica (EIC) da UFS, em 2018. (Foto: Adilson Andrade – Ascom/UFS)

Albert se mostra muito satisfeito em participar de um projeto que contribui na vida de outras pessoas, e isso, para ele, é a sua principal realização com a tarefa.

“Fico orgulhoso. Eu me sinto realizado, porque é uma oportunidade que foi dada, sempre tive interesse, quem nunca leu uma história da Marvel? Eu mesmo sou fã do Thor. Além do crescimento pessoal, estou ajudando pessoas. Pessoas que não têm um futuro definido, que pode gerar um interesse. Isso é muito bom! Acho que a realização maior é nesse sentido, você parar e perceber ‘cara, eu estou ajudando pessoas a tomar decisões’”, declara Albert.

Premiação

No 28º Encontro de Iniciação Científica (EIC), realizado em novembro de 2018, a pesquisa “Roteirista para gibis do Almanaque para popularização de Ciência da Computação foi reconhecida com uma menção honrosa, em apresentação de pôster digital na área de Ciências Exatas e da Terra. O trabalho foi realizado naquele ano por Icaro Dantas Silva e orientado por Maria Augusta Silveira Netto Nunes.

Além dos enredos, o projeto consistiu na criação de passatempos para fixar o conteúdo abordado no gibi. Os resultados da pesquisa foram a criação de mais duas séries do projeto: Metodologia Científica e Tecnológica e Pensamento Computacional. Na primeira, foram desenvolvidos 6 volumes sobre Criação de Artigos e Mapeamento Sistemático e, na segunda, um volume abordando uma introdução sobre Pensamento Computacional.

Acesse o site do Almanaque para Popularização de Ciência da Computação e tenha acesso às 12 séries do Almanaque, à resolução dos passatempos e ao banco de personagens disponíveis.

Emerson Esteves*
Marcilio Costa (jornalista supervisor)
* Estudante de Jornalismo da UFS. Esta matéria foi desenvolvida como parte das atividades de Estágio Curricular Supervisionado do curso.


Atualizado em: Ter, 20 de agosto de 2019, 16:24
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